16º dia - 10/01/2018 - Generosidades

Buenas, pessoal!
Resolvi usar a palavra "Generosidades" como título da postagem de hoje porque mais uma vez circunstâncias me provam que o ser humano é essencialmente bom, solidário e prestativo. Ainda mais numa jornada solo como a minha, onde qualquer atitude de um desconhecido faz toda a diferença. Já conto.
Mas vamos ao dia de hoje:
A boa cama na pousada em San Miguel del Monte cobrou seu preço depois, já na estrada: saí mais tarde do que queria porque dormi mais do que devia. Somente às 08h iniciei a percorrida.
O dia já amanheceu muito quente e abafado. O vento nordeste, a favor de mim, embora tenha diminuído o esforço de tracionar a bike, tornou o asfalto uma fornalha, porque eu praticamente o anulei, pedalando a cerca de 15 km/h. O vento contra, embora deixe a pedalada mais pesada, ajuda a minimizar o calor.
Resultado? Às 11h, depois de ter feito 40 km, procurei uma sombra e ali fiquei até às 15h, aguardando o sol dar uma trégua. Estava destilando de tanto suar, e percebia que o desgaste estava sendo maior do que o normal.
Pouco antes de parar, passei pelo Rio Saladero, de águas barrentas e forte correnteza. Uma novidade, porque estou pedalando por uma gigantesca planície, não há tanto desnível que justifique a força e a velocidade da água naquele ponto.


Só não fui ao banho porque fiquei procurando o final do guard-rail instalado na pista, e ele terminou longe, 2 km à frente. Achei que seria muito trabalho voltar todo o trecho, por uma estrada de terra, e depois retornar: 4 km a menos, num dia de calor como hoje, foram mais convincentes do que um mergulho.
Minha parada estratégica, ao meio-dia, se deu sob um mato de eucalipto, à entrada de uma fazenda. Sem fome, só com sede, sede, sede, tirei a lona azul que enfeita minha caixa de frutas, estiquei-a sobre o capim, peguei meu travesseiro inflável e dormi o sono dos justos por duas horas. Acordei molhado de suor, porque naquele horário até o vento quente parou de soprar. Decerto foi sestear também, o danado.
Fiquei pensando na vida por mais um tempo, rezei um pouco, e às 15h voltei para o asfalto, já prevendo dureza nos 40 km faltantes até Las Flores - meu destino de hoje.
Pelas 17h, parado à beira da estrada, no olho do sol, tomando minha "deliciosa água quente" das caramanholas, percebi que um GM Corsa Wagon passou por mim, reduziu a velocidade, deu ré, o vidro se abriu e uma senhora me perguntou: "Problemas?" Disse que não, que estava descansando. "Quer água fria (gelada)?" Atravessei a rodovia, já com a caramanhola na mão. A mulher disse que eu podia trazer a outra também. E assim fui presenteado com 1 litro de suco de laranja, super gelado, tirado de dentro de uma garrafa térmica!


Gente, num dia como hoje, nesse calor, ganhar de uma desconhecida 1 litro (1 litro!!!) de suco gelado, bah, foi demais! Apresentou-se como "Ave Fenix" (evidentemente um nome fictício), pois disse que teve que recomeçar sua vida, a exemplo da mitológica ave que ressurgiu das cinzas... Lógico que não entrei em detalhes. É policial federal, e falou que me adicionaria no facebook para acompanhar minha jornada e contatar com seus colegas, caso eu tivesse algum problema. "Não é para atrapalhar teu desafio, é para te ajudar, se necessário". À Fenix, tenha ela o nome que tiver, gracias!
Cheguei em Las Flores às 19h, me hospedei no Hotel Galó, tomei banho, preparei o mate e fui ao mercado, comprar mantimentos para um jantar.


(Caía uma garoa quando saí. Será que pedalarei com chuva amanhã? O tempo está bem enfarruscado para as bandas dos Andes.)
No minimercado La Solitaria (acho que é esse o nome, me esqueci de anotar), conversa vai, conversa vem, o proprietário soube que eu estava viajando, e quando fui pagar pelo suco, pelo iogurte e pelos sanduíches - que ele mesmo preparou -, me disse: "Pagas só o suco e o iogurte, os sanduíches são um regalo (presente)". Insisti, quis pagar, não aceitou. Me desejou suerte na viagem, e se despediu de mim apertando minha mão com força.


Antes de devorar dois deles, já no hotel, os fotografei, emocionado. Tinham gosto de generosidade. Tinham gosto de solidariedade. Como aquele suco de laranja gelado...
Hoje à noite, na oração vespertina, pedirei a Deus que os abençoe e os guarde, e que derrame sobre eles e sobre todas as pessoas as graças que d'Ele emanam. 
Enfim... Foram 76 km hoje percorridos.
Amanhã, pretendo chegar a Azul, uns 120 km à frente. Se estiver chovendo, contudo, talvez tenha que mudar os planos.
Bait'abraço!

Comentários

  1. Bom dia! Que legal Paulinho! Como é bom saber que existe pessoas boas neste nosso mundo. Que Deus Abençoe elas e você também amigo. Boa viagem!

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  2. Fantástico. Este é o ser humano na sua essência.

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  3. Muito bom ler isso Paulinho, sobre a sensibilidade que ainda existe em alguns seres humanos. Que bom que Deus está fazendo essas almas passarem pelo teu caminho. Vai com fé !!

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  4. Generosidade, realmente, são pessoas que Deus está colocando em teu caminho! Abraço Petry.

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  5. Abraço de Santa Rosa, Sr. Paulo! Estou acompanhando sua vida viagem desde o início, indicação de um amigo. Seus relatos são um afago, para quem tem a estrada na alma.

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